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Artigo

A fotografia e o processo desconstrução social da memória

 

Sergio Luiz Pereira da Silva

 

 

A fotografia é, indiscutivelmente, uma forma de expressão no campo da arte visual, universalmente acessível e relativamente fácil em sua dimensão prática, mas seguramente a sua forma de estruturação estética e o seu processo de interpretação imagético se inscrevem dentro de outros campos simbólicos além do artístico.

 

Refiro-me ao campo da estética, da hermenêutica visual e, por fim, da memória. Esses campos são estruturados pelo processo de representação e significação da realidade na produção de determinados tipos de saber. Segundo Bourdieu, a fotografia, em sua dimensão prática, é acessível como bem cultural, universalmente consumido; complemento essa assertiva afirmando que tal prática cultural proporciona a constituição de um banco de memória visível, dis-ponível no campo da cultura visual.

 

Há algo que tangencia a fotografia e a memória; ambas é um processo de edição em que a escolha do que vamos ver e memorizar é definido por um esquema de seleção prévia (escolha), definido a partir de critérios conscientes e socialmente elegíveis de edição (corte).

 

No caso da fotografia, esses critérios são definidos a partir do que se quer mostrar com base na ação social do olhar; percebo, escolho, faço a medição da luz, componho e, “click”, registro fotograficamente.

 

No ato fotográfico, há uma relação dialética entre realidade e representação na qual a síntese é quase sempre a representação da representação, ou seja, no processo de ancoragem da percepção fotográfica, a escolha do recorte do real imagético registra uma representação esteticamente instrumentalizada que descontextualiza o real visto e tangível.

 

A imagem fotográfica é uma criação das formas sociais do olhar. É com base na relação entre ação social e imagem que esse texto aponta questões sobre como definir a centralidade do olhar como uma forma de ação social dialógica na sociedade da informação e da cultura visual.

 

Isso pode ser definido de forma elementar no processo convencional da fotografia. Talvez o exemplo mais curioso e radical desse processo simples do ato fotográfico possa ser demonstrado a partir do trabalho dos fotógrafos cegos, que têm produzido trabalhos maravilhosos e esteticamente inovadores nos nossos dias.

 

Para esses fotógrafos, como Evgem Bavica, um dos mais conhecidos, ou para os fotógrafos do coletivo www.fotografoscegos.com.br, é seguro que o mais relevante nas suas produções fotográficas é justamente a forma do olhar sobre o que se vê, a partir de outras percepções do olhar.

 

A fotografia, nesse sentido, tem uma definição prévia,baseada nos critérios de definição estética e, com isso, a seleção do que é visto se antepõe à forma como as coisas são vistas. A percepção e a imaginação dão forma à realidade visual. E essa realidade visual pode ser vista como um resíduo imagético e imaginado da realidade.

 

A fotografia proporciona um equilíbrio dialético entre o “como se vê” e “que se vê” e o resultado é uma representação estética rica em elementos diferenciados de descontextualização da realidade para expressar uma imagem. Trabalhos como os do fotografo búlgaro Evgem Bavca são expressivamente ricos sobre como se pode ver, perceber, editar e, com isso, constituir uma noção de beleza, sem o elemento da visão, tão funcional, instrumental e convencional para tal coisa.

 

Com isso, podemos afirmar que, de fato, não é preciso “ver para crer”, ao contrário do que sempre ouvimos da máxima de São Tomé. Ou, mais precisamente, dentro desse contexto, não é preciso ver para criar, como nos mostram os fotógrafos cegos contemporâneos.

 

A construção social da imagem e da imaginação são fenômenos próximos à construção social da memória; em todos esses casos, há aquilo que chamamos anteriormente de processo de seleção (escolha) e edição (corte); tanto um como outro irão compor a percepção (estética) da coisa a ser vista dentro de um suporte físico (imagem fotográfica) ou imaginada (projeções mentais).

 

Se memorizar é criar um registro de imagem, fotografar é memorizar um momento em forma de presença e ausência de luz, ou seja, registrar com luz e sombras uma imagem em um suporte físico seja esse um filme, um sensor eletrônico ou mesmo diretamente um papel fotossensível, como se faz na fotografia pinhole , em que uma lata imune a qualquer presença de luz é perfurada por uma ponta de agulha, furo pelo qual a luz irá projetar diretamente, num suporte fotossensível, a imagem frontal presente diante do furo. Isso faz com que a fotografia assim como a memória seja resíduos imaginados da realidade.

 

(continue lendo no site abaixo)

http://www.academia.edu/3570724/Artigo_A_Fotografia_e_o_Processo_de_Constru%C3%A7%C3%A3o_Social_da_Mem%C3%B3ria

 

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